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Pensatas sobre migração e refúgio na infância e adolescência

Por Fernanda Paraguassu

Propostas para uma educação intercultural, integradora e antirracista

por | mar 16, 2024 | viu isso?

A Conferência Livre Nacional “Infâncias Protagonistas: Políticas Educacionais para Crianças e Jovens Imigrantes, Refugiados e Apátridas” enviará uma série de propostas para uma educação intercultural, integradora e antirracista para a 2ª. Conferência Nacional de Migrações, Refúgio e Apatridia – 2ª COMIGRAR, convocada pela Secretaria Nacional de Justiça/MJSP, para os dias 7, 8 e 9 de junho deste ano, em Foz do Iguaçu (PR). A etapa preparatória da 2ª COMIGRAR conta com 132 conferências.

Três mulheres migrantes vão defender as propostas na área da Educação durante a etapa nacional. Foram eleitas delegadas durante a Conferência Livre Nacional “Infâncias Protagonistas: Políticas Educacionais para Crianças e Jovens Imigrantes, Refugiados e Apátridas”: Patricia Adorno (Paraguai), Merlina Saudade (Venezuela) e Nilza Laice (Moçambique).

A Conferência Livre Nacional “Infâncias Protagonistas: Políticas Educacionais para Crianças e Jovens Imigrantes, Refugiados e Apátridas” foi convocada, no dia 24 de fevereiro, pela Rede Internacional de Pesquisa Infâncias Protagonistas: Migração, Arte e Educação, coordenada pela Profa. Luciana Hartmann, da Universidade de Brasília. O evento foi o primeiro realizado de forma totalmente virtual e teve 111 participantes, sendo 58 brasileiros e 53 migrantes. O objetivo foi consolidar propostas de políticas públicas na área da Educação, uma vez que as conferências livres nacionais devem ser temáticas.

Segundo a diretora do Instituto Migrações e Direitos Humanos, Irmã Rosita Milesi, que participou da abertura do evento, o acesso das crianças à educação independe da condição migratória. “É um direito inalienável, incondicional e legal das crianças e adolescentes”.

A primeira edição da COMIGRAR foi realizada em 2014, em São Paulo, e foi considerada um marco histórico da política brasileira de migrações, refúgio e apatridia. Envolveu cerca de 5 mil pessoas em mais de 200 conferências e produziu recomendações estratégicas em um contexto social e político que culminou na publicação da Lei n. 13.445/2017, a Lei de Migração.

Neste ano, a 2ª COMIGRAR terá como tema “Cidadania em Movimento”, visando construir as bases para o Plano Nacional de Integração de Migrantes, Refúgio e Apatridia. O objetivo é mobilizar diversos atores sociais, políticos e institucionais interessados no tema, além de fomentar a participação social e política de pessoas migrantes, refugiadas e apátridas.

Veja a seguir as propostas aprovadas pela Conferência Livre Nacional “Infâncias Protagonistas: Políticas Educacionais para Crianças e Jovens Imigrantes, Refugiados e Apátridas” que serão encaminhadas para a esfera federal, de acordo com os eixos temáticos definidos pela Secretaria Nacional de Justiça.

MiRe contribriu na mediação do grupo de trabalho do Eixo 1.

PROPOSTAS DIRECIONADAS PARA A ESFERA FEDERAL 

EIXO 1  Igualdade de tratamento e acesso a serviços públicos 
1Criar, em parceria com os Estados, o Distrito Federal, os municípios, as universidades e a sociedade civil programas/cursos de capacitação dos profissionais que atuam nas escolas e de mediadores culturais com foco no acolhimento e na matrícula de crianças e jovens migrantes, refugiados e apátridas, especialmente em relação à legislação vigente que garante esse direito. 
2Demandar ao Ministério da Educação a criação de uma plataforma de boas práticas pedagógicas para facilitar a operacionalização de processos de acolhimento e integração, com materiais didáticos interculturais de acesso público. 
3Aperfeiçoar os programas/sistemas de cadastramento de estudantes migrantes, refugiados e apátridas das Secretarias de Educação, com a inclusão de sua nacionalidade e de seus responsáveis, ainda que na ausência de Cadastro de Pessoa Física (CPF), Registro Nacional de Estrangeiro (RNE) ou Registro Nacional Migratório (RNM).  
4Encaminhar ao Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) a sugestão de inserção de campo, no censo escolar, que permita levantar as matrículas de migrantes/refugiados/apátridas, considerando a língua materna destes, que impactarão a condução de políticas públicas brasileiras em diferentes áreas, especialmente em educação. 
5Criar uma Política Nacional de Educação de Migrantes, Refugiados e Apátridas nos moldes da Política Nacional de Educação Especial, na perspectiva inclusiva e da educação intercultural, que favoreça o acolhimento, a socialização e o direito à aprendizagem, incluindo a atuação de mediadores culturais e/ou tradutores, além de pessoal docente que domine a língua materna da criança e do adolescente, e que contemple demandas específicas, tais como de crianças e adolescentes indígenas e africanos, considerando ainda a criação de escolas indígenas específicas para  migrantes e refugiados, com profissionais indígenas migrantes e refugiados.
EIXO 2 Inserção socioeconômica e promoção do trabalho decente
1Garantir o direito de pais, mães e responsáveis de crianças migrantes, refugiadas e apátridas ao exercício do trabalho decente e cumprimento com as premissas de educar/cuidar,  promovendo o acesso e a permanência dessas crianças desde bebês (primeira infância) à educação básica e a Educação Infantil em instituições públicas em jornada integral, quando disponibilizada pela instituição de ensino, ou em atividades de contraturno, com a devida atenção ao acolhimento e especificidades, incluindo culturais e linguísticas da criança e da família.
2Produzir e disseminar informações a respeito de programas de estágio e de inserção no mercado de trabalho já existentes, como Jovem Aprendiz, para adolescentes migrantes, refugiados, e apátridas, considerando a especificidade das pessoas com deficiência,  por meio de parcerias com instituições como o  Centro de Integração Empresa Escola (CIEE), bem como criar programas específicos, como Jovens Aprendizes Interculturais,  com o objetivo de promover a troca intercultural nas empresas e despertar o interesse por esses jovens, facilitando o acesso ao mercado de trabalho.
3Sensibilizar e conscientizar empresas a respeito da potência da diversidade da perspectiva de jovens migrantes, refugiados e apátridas para estimular o acesso ao mercado de trabalho. 
4Estabelecer política pública com base legal que assegure a migrantes, refugiados e apátridas o direito de participarem em concursos para acesso ao serviço público, inclusive por meio de reserva de vagas para professores indígenas migrantes e refugiados.
5Produzir e disseminar informações a respeito das normas trabalhistas no Brasil, em formato acessível e adequado à população jovem refugiada, migrante e apátrida e em diferentes canais, de modo a eliminar o desconhecimento, promover o trabalho decente e reduzir os riscos do trabalho em condições análogas à escravidão.
EIXO 3 Interculturalidade e diversidades
1Inserir no calendário escolar nacional a semana do Migrante e do Refugiado, dia 19 a 23 de junho, implementada pela lei 14.678 de 18 de setembro de 2023, para promover eventos culturais que representem a diversidade de povos ou países, disseminação de informações, integração linguística entre escola e comunidade por mediadores culturais na formação pedagógica e o combate a discriminação a migrantes, refugiados e apátridas. 
2Garantir que temas relacionados à interculturalidade, interseccionalidades, xenofobia e racismo, presentes nos currículos escolares, sejam cumpridos por meio de programas Nacionais como o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE e o Programa Nacional do Livro e do Material Didático (PNLD), dando visibilidade à população migrante, refugiada e apátrida.
3Criar políticas públicas para implementação da formação continuada de professores da Educação Básica que atuam no acolhimento e na formação cultural de bebês, crianças, adolescentes e adultos imigrantes, refugiados e apátridas nas escolas brasileiras, em parceria com as universidades e Secretarias de Educação dos Municípios, Estados e Distrito Federal, pensando as interseccionalidades desse público.
4Implementar programas artísticos e culturais nas escolas e seus territórios expandidos, fomentando práticas interculturais, com mediação linguístico-cultural, iniciativas de acolhimento territorial para integração e participação ativa de crianças, jovens migrantes, refugiados e apátridas na comunidade escolar.
5Oferecer cursos de língua portuguesa e culturas, iniciação científica e formação profissional com certificação para os estudantes migrantes, refugiados e apátridas e suas famílias.
EIXO 4 Governança e participação social
1Aperfeiçoar as políticas educacionais vigentes para que a integração intercultural da população migrante, refugiada e apátrida conste nas normativas e nos currículos das instituições educacionais, considerando suas especificidades. 
2Promover e subsidiar iniciativas interculturais de integração educativa da população migrante, refugiada e apátrida nas Secretarias de Educação, como a inserção permanente de mediadores culturais/ tradutores nas unidades escolares.
3Promover ativamente a participação das famílias e jovens migrantes, refugiados e apátridas nos organismos como Conselhos Tutelares, Conselhos da Juventude, entre outros, por meio de grupos de trabalho, troca de saberes, rodas de conversa, e outras metodologias participativas. 
4Criar estratégias de acompanhamento e orientação sobre políticas educacionais de inclusão da população migrante, refugiada e apátrida junto ao Ministério da Educação.
5Criar procedimentos de acolhimento que possam determinar e garantir o interesse superior da criança, incluindo a participação ativa de crianças e jovens migrantes, refugiados e apátridas em processos amigos das infâncias. 
EIXO 5 Regularização migratória e documental
1Implementar, na esfera do serviço público e especialmente na área escolar/educacional, cursos e workshops voltados para os/as profissionais que atuam nestes espaços sobre o direito de acesso das crianças migrantes, refugiadas e apátridas à escola, sem a exigência de apresentação de documentos escolares do país de origem.
2Adotar critérios de nivelamento escolar claros e facilitados para promover a inclusão escolar mais humanizada e equitativa das crianças e adolescentes migrantes, refugiadas e apátridas.
3Promover e possibilitar a adesão de intérpretes comunitários / mediadores culturais para agilizar e favorecer as tratativas documentais e de inserção escolar.
4Flexibilizar as exigências de documentação para facilitar o processo de naturalização de crianças migrantes e refugiadas e seus responsáveis em situação de vulnerabilidade social, com ênfase naquelas que provém de países em contexto de crise generalizada de direitos humanos e que não têm acesso a serviços consulares para a emissão da documentação requerida.
5Apoiar financeiramente municípios, estados e secretarias para implementação de políticas de incentivo à permanência escolar das crianças e adolescentes migrantes, refugiadas e apátridas, como, por exemplo, garantindo o acesso aos materiais escolares, uniformes e todos os utensílios necessários para o pleno aprendizado escolar, independente do mês em que se inserirem no ano escolar. 
EIXO 6 Enfrentamento a violações de direitos
1Garantir o acesso e permanência em creches, pré-escolas, escolas e EJA aos bebês, crianças e jovens migrantes, refugiados e apátridas independentemente da situação migratória e documental, vedando, desta forma, a prática da discriminação documental no acesso a matrícula escolar. 
2Aperfeiçoar o sistema de avaliação dos Editais de Fomento à Cultura e outras áreas, de forma a contemplar projetos propostos por pessoas de grupos sub-representados, como a população migrante, refugiada e apátrida, e também projetos que promovam a acessibilidade para crianças e pessoas com deficiência. Além disso, integrar nos Editais de Fomento à Cultura a diversidade cultural, adaptando os requisitos de inscrição para que grupos culturais migrantes possam acessar em equidade de condições.
3Constituir núcleos de apoio psicossocial para crianças e jovens migrantes, refugiadas e apátridas vítimas de racismo, xenofobia e outras formas de discriminação, nos estabelecimentos educacionais, favorecendo uma educação intercultural, integradora e antirracista.
4Promover e subsidiar formações periódicas sobre atendimento humanizado e inclusivo para famílias migrantes nas escolas públicas, em conjunto com organizações públicas e privadas voltadas para migrantes ou formadas por migrantes.
5Realizar formações periódicas de criação de projetos direcionadas aos grupos culturais de migrantes, refugiados e apátridas, especialmente aqueles formados por jovens, para que possam concorrer equitativamente aos Editais de Fomento à Cultura.

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