Papo sério

Sudão do Sul: a tragédia infantil

por | 29 maio, 2025 | comportamento e saúde, papo sério

Sudão do Sul, o país mais novo do mundo, que nasceu em 2011, enfrenta a maior crise de deslocamento infantil do mundo. Quase cinco milhões de crianças abandonaram o país em que vivem, segundo o Fundo das Nações Unidas para a Infância,  UNICEF. O país ainda enfrenta as consequências de um conflito armado que se encerrou em 2018 e matou 400 mil pessoas e está à beira de uma guerra civil depois da prisão do vice-presidente do país, Riek Machar, neste ano.

As crianças deveriam estudar, se alimentar corretamente, ter a segurança garantida e ainda se divertirem, porém não é a realidade das crianças sul-sudanesas. Segundo o UNICEF, 2,6 milhões  no Sudão do Sul nasceram em meio à guerra, o que representa 3 a cada 4 crianças nascidas no país.

O reflexo da guerra ainda pode ser sentido na vivência das crianças, que, além do medo e da falta de oportunidades, ainda estão reféns de gangues armadas que dominam o país. Os menores são usados como soldados, mensageiros e cozinheiros, e sofrem abuso sexual. O UNICEF estima que dezenove mil crianças no país vivem nesta situação.

Um milhão de crianças que não estão sob o domínio desse grupo sofrem com um processo de desnutrição e 300 mil dessas estão com desnutrição grave e com risco de morte. O desmatamento, a exploração do meio ambiente e a emergência climática também favorecem esse cenário, uma vez que as águas da região rural do país estão contaminadas pela indústria petroleira. Moradores relataram à reportagem da ONU que passam mal ao ingerir alimentos preparados nessa água ou ao tomá-la pura.

A situação da educação também é bastante precária. As próprias escolas foram destruídas, fechadas ou estão ocupadas desde 2013, segundo o UNICEF, devido aos conflitos armados, sendo 70% das crianças que não têm acesso à educação, prejudicando o crescimento do país.

O maior grupo que é prejudicado pela falta de educação no país são as meninas, devido ao casamento infantil e aos valores religiosos. Além disso, segundo o UNICEF, pela questão financeira, acabam preferindo enviar os filhos homens às escolas do que as mulheres, e também têm receio de que elas sofram alguma violência ou abuso no trajeto.

As crianças com deficiências também sofrem com a falta de acesso à escola, sendo apenas 4% do total de alunos. Mesmo os que conseguem o direito ao estudo ainda sofrem por não haver professores treinados para garantir uma educação adequada aos alunos.

O UNICEF fez um relatório sobre a questão educacional do país e concluiu que as dotações orçamentárias para o setor educacional vêm diminuindo desde a independência, além de não haver um projeto claro de promoção da educação no país — isso tudo em um sistema marcado por uma alta demanda de estudantes.

O sistema de educação do Sudão do Sul apontava diversos problemas, entre eles a falta de investimento adequado, professores pré-primários não capacitados, a coordenação entre os setores estaduais, municipais e federais não é feita da maneira correta, e os alunos mais marginalizados, que vivem em comunidades pastoris, não têm modalidades alternativas para o seu caso.

Antes dos bebês virem ao mundo no Sudão do Sul, eles já passam por problemas. Como mostra a reportagem do UNICEF, uma mãe tem medo de ter o filho pela falta de recursos. Apenas 9% dos partos são feitos por profissionais no país, sendo a maioria realizados em casa. Nyabil Abydouh, de 29 anos, disse: “Se não tiver navalha, a gente tem que afiar aqui um pedaço de madeira para cortar.”

A organização Médicos Sem Fronteiras percebeu um grande aumento dos casos de malária no país, atingindo também as crianças: 400 crianças por semana com a forma grave da doença no mês de setembro. A média mensal era de 43 crianças atendidas por semana em um hospital. Pela falta de leitos, algumas eram atendidas no corredor do próprio local. Uma das principais causas desse aumento são as enchentes no país, que afetaram 1 milhão de sul-sudaneses no ano passado.

O Sudão do Sul está enfrentando as piores inundações em 10 anos, segundo o Gabinete das Nações Unidas para os Assuntos Humanitários (OCHA). 379 mil sul-sudaneses foram deslocados de suas casas por causa dessa emergência climática.

A fome é intensificada por essas emergências climáticas e piora a situação já drástica do país. O Programa Alimentar Mundial das Nações Unidas (PAM) disse que suas reservas alimentares no Sudão do Sul estavam vazias e que precisava de 404 milhões de dólares para preparar a ajuda para 2025, num contexto de “custos operacionais crescentes” e de fome.

O Acnur acredita que a situação ainda vai perdurar no país até que uma solução política seja encontrada. O Sudão do Sul, antes da sua independência, fazia parte da República do Sudão e vivia em guerra desde a independência, em 1955, que teve uma pausa com um acordo de paz em 2005. Depois de um referendo, 90% da população votou pela criação do Sudão do Sul, em 2011.

Em 2013, a insegurança voltou a afligir o Sudão do Sul, quando o presidente demitiu todo seu gabinete, incluindo seu vice-presidente Riek Machar, membro de uma das etnias mais populosas do país. Em 2015, com ameaça de sanções, o presidente assinou um acordo com seu vice. Depois de 6 meses, o conflito eclodiu novamente, tendo um novo acordo de paz em 2018. Com a prisão do vice-presidente, Riek Machar, neste ano, o conflito corre risco de se acelerar.

Imagens: Unicef


Por Francisco Procópio (Aluno da Escola de Comunicação da UFRJ, sob supervisão de Fernanda Paraguassu)

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