Profissionais ajudam a superar barreiras linguísticas e culturais, promovendo integração e compreensão entre diferentes comunidades
Chegar a um novo país nunca foi tarefa fácil, especialmente quando se é imigrante ou refugiado. Entender uma nova língua, outras formas de se relacionar e compreender outros aspectos de uma cultura totalmente diferente são barreiras que se impõem entre quem está chegando a um local novo e as oportunidades — financeiras e de relacionamento interpessoal — que os esperam. É nesse contexto que o profissional de mediação cultural se insere.
— Um mediador cultural é um construtor de pontes, facilitando a compreensão e a comunicação entre pessoas ou grupos de diferentes origens culturais. Isso envolve a tradução de palavras faladas e escritas para garantir uma comunicação precisa, esclarecendo normas, valores e comportamentos culturais para evitar mal-entendidos e promover o respeito — explica Hamid Farahani, iraniano que chegou ao Brasil em 2022 e trabalha como mediador cultural na organização Panahgah.
Farahani é do Irã e costuma ser mediador para imigrantes e refugiados afegãos, por ambos países terem culturas mais próximas e, inclusive, falarem a mesma língua, o persa (apesar de existirem diferenças entre o persa falado no Irã para o do Afeganistão).
Segundo ele, os mediadores também ajudam os imigrantes e refugiados a entender e acessar serviços essenciais, como educação, assistência jurídica e saúde. Farahani também destaca o papel do mediador como ponte entre essa parcela populacional e autoridades e organizações públicas.
Bob Montinard, imigrante haitiano e co-fundador da Mawon — organização que tem como objetivo auxiliar na integração socioeconômica de imigrantes e refugiados —, explica que o papel de mediador cultural já o acompanha desde antes da chegada ao Brasil.
— No Haiti já tem a cultura do […] rasta […]. Então eu uso dreads, respeito toda a cultura rastafári. Mesmo no Haiti eu já era uma pessoa que precisava de uma mediação intercultural, porque eu tenho uma cultura diferente da cidade em geral. Então, desde o Haiti eu já trabalhava como mediador de conflito [entre culturas].
Montinard trabalhou por mais de 10 anos pela Organização das Nações Unidas (ONU) e por outras organizações internacionais. Ele chegou ao Brasil após o terremoto de 2010 no Haiti, que atingiu ele e sua família. Montinard conta que tinha vontade de criar um braço não só de integração cultural, como também que promovesse auxílio para a questão econômica de imigrantes e refugiados.
Apesar da importância desses profissionais, não há uma lei específica que torne obrigatória a presença de um mediador cultural dentro das organizações que lidam com imigração e refúgio. Procurado pela reportagem, o Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) — órgão ao qual o Conselho de Imigração (CNIg) está integrado — afirmou que “não é especialista para tratar sobre esse tipo de profissional”, alegando que a função e suas implicações seriam melhor abordadas “por especialistas ou conselho de classe específico que trabalhem diretamente com essas questões”.
“A atuação do órgão colegiado consiste em verificar se o trabalho do migrante atende às condições previstas na legislação brasileira e se o contrato está de acordo com os parâmetros legais”, escreveu o MJSP em nota.
Entretanto, o ministério divulgou à reportagem que, no ano passado, foram concedidas cinco autorizações de residência para profissionais de mediação cultural. Por outro lado, quatro pedidos foram arquivados por desistência dos requerentes.
Caminho a percorrer
Farahani observa que, embora o Brasil tenha avançado no trabalho com imigrantes, ainda há uma necessidade de maior investimento em mediação cultural em organizações oficiais. Para ele, o aumento na promoção de especialistas pode “garantir que informações claras e culturalmente sensíveis sejam fornecidas aos imigrantes com relação aos seus direitos, responsabilidades e recursos disponíveis”.
— Ao fornecer apoio abrangente aos imigrantes, os mediadores culturais permitem que eles se adaptem à sociedade brasileira e contribuam com suas habilidades e talentos. Em última análise, isso promove maior compreensão e aceitação entre os imigrantes e a comunidade anfitriã, levando a uma sociedade mais harmoniosa e inclusiva.
Bob — que luta para que o trabalho de mediador cultural se torne obrigatório em todas instituições oficiais de imigração e refúgio — entende ser necessário um cuidado maior na hora de receber estas pessoas no país.
— Existem instituições, por exemplo, que o imigrante vai chegar e a mediação cultural vai ser feita de uma forma agressiva, de uma forma racista — declara.
Na visão dele, o mediador é um profissional que precisa saber escutar o outro. De acordo com ele, o trabalho de mediação é necessário não só para atender as necessidades básicas do imigrante e do refugiado, mas também para intervir nos conflitos que possam existir devido às barreiras culturais entre o país de origem e o Brasil.
Farrani acredita que os mediadores são “essenciais” para que haja uma integração ideal de imigrantes e refugiados no Brasil. O mediador iraniano explica que, ao mesmo tempo em que ajuda os recém-chegados a compreender a cultura brasileira, esta profissão possibilita uma compreensão maior também da parte dos brasileiros para o histórico socioeconômico e cultural dos imigrantes e refugiados.
— Os mediadores culturais promovem a compreensão e a aceitação entre os imigrantes e a comunidade anfitriã, criando um Brasil mais inclusivo e harmonioso.
Por Por Giovanna Machado, Isa Morena Vista e Maria Nascimento, estudantes da disciplina de Laboratório de Cidadania, do curso de Jornalismo da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), ministrada pela Profa Fernanda Paraguassu.
Sob supervisão de Fernanda Paraguassu.
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