Carta aberta para crianças e adolescentes migrantes que chegam num país diferente e buscam um pouco de afeto para seguir adiante.
“Olá,
Meu nome é Atenea e fui uma criança migrante no Brasil. Já é difícil ser criança e adolescente, imagina então quando você pensa num idioma diferente que o de todo mundo ao seu redor? Eu fiquei assustada muitas vezes -MUITAS MESMO- mas, algo que aprendi foi, é normal ter medo, e o medo mostra que eu tenho coragem, então se eu sou corajosa por ter medo, sou mais corajosa ainda quando supero esse medo.
Eu vou resumir minha história pra você me conhecer melhor: Nasci em Brasília, mas minha mãe, minha avó e minha tia são colombianas. Quando eu era bem pequena a gente foi morar lá na Colômbia e fiquei até os 12 anos em Medellín. Lá eu era “a brasileña”, mas eu não sabia sambar, nem jogar futebol, nem falar português. As únicas palavras que eu conhecia do idioma eram das músicas da Kelly Key, da Xuxa e da Banda Calypso, porque minha mãe sempre botava esses CDs pra tocar quando era dia de lavar a casa.
Quando fiz 13 anos a gente voltou para o Brasil. Foi muito confuso para mim. Eu era brasileira, legalmente, mas eu tinha uma cultura, uma língua e uns costumes, que não tinham nada a ver com o Brasil. Ao mesmo tempo eu não era colombiana, pois não tinha nascido lá.
Quem eu era então? Por muito tempo, eu tive para mim que não era nem colombiana, nem brasileira. Mas, se você está seguindo a mesma linha de raciocínio que eu, é melhor ver o copo meio cheio, né? Eu demorei anos, quase uma década, para entender que não era que eu não pertencia a nenhuma das duas culturas, mas, sim, que eu era fruto delas. Hoje eu sei que sou colombo brasileira, e isso faz de mim uma eterna migrante.
A seguir, eu quero deixar um recado para a criança que existe aí no seu mundo. Ela pode ser sua criança física, como filhos, irmãos, primos, amigos, ou então a sua criança interior. Para qualquer uma delas, deixo minhas palavras: Quem te trouxe para o Brasil, fez isso pensando no melhor para seu futuro. É, eu sei, é um saco estar sozinha num país desconhecido, com uma língua tão distinta da nossa e vivendo situações na escola que fazem com que a gente se esconda no banheiro até o intervalo acabar, porém, isso vai passar, eu juro de pé junto!
Em algum momento você vai alcançar algo com que você nem tinha sonhado, porque no seu país isso parecia impossível, e então você vai dar razão a quem decidiu te dar essa oportunidade. Por isso, segure a mãozinha de quem te acompanha e permaneça firme nos seus sonhos. Tenha a certeza de que eles serão a força que você precisa para alcançar tudo o que seu coração deseja, e mais, seus sonhos serão seu motor durante a jornada, na maioria das vezes, eles irão encontrar os de outras pessoas, ou irão mudar e se tornar algo muito melhor!
Não esqueça suas raízes, e ainda, crie outras, somente assim será possível revelar a grande magnificência (duvido você conseguir falar três vezes essa palavra rapidão) que você leva dentro do seu coração. Nós somos como um pássaro migratório, que tem a potencialidade de se reconhecer em cada árvore que pousa, cada brisa que atravessa, cada nuvem que o acompanha.
Para finalizar: o seu sotaque é lindo, seus costumes são muito legais e o mais importante: seu nome é sua identidade. Não se esqueça disso, eles fazem de você a sua história, e você é a pessoa mais incrível do mundo inteiro. Espero que você fique bem, e acredite nas minhas palavras. Estarei aqui segurando sua mão.
Sempre.
Um beijo.”
Atenea Garcia Gómez foi uma criança migrante. Nasceu no Brasil, migrou para a Colômbia e voltou para o Brasil.
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